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terça-feira, 28 de fevereiro de 2012

Avaliação escolar

4º Ano

Busque embasamento sobre o tema no site
 http://web.unifil.br/docs/revista_eletronica/educacao/Artigo_04.pdf

quinta-feira, 23 de fevereiro de 2012

4º Ano - Prática de formação

DIDÁTICA: ferramenta cotidiana do professor

(*) Nelson Valente

A Didática Geral é uma ciência teórico-prática que pesquisa, experimenta e sugere formas de comportamento a serem adotadas no processo da instrução, com vistas à eficiência e eficácia da ação educativa.
A Didática é a ferramenta cotidiana do professor e, como tal, está em contínua evolução, razão porque os conteúdos deste curso destinam-se não só a reforçar os conceitos fundamentais dessa disciplina mas, sobretudo, aperfeiçoar e atualizar o professor pelo conhecimento de novas técnicas que possam vir a ser utilizadas em sala de aula.
Didática tem origem no idioma grego; provém de didaktiké significando a arte (maneira) de ensinar ou instruir. É uma ciência teórico-prática, que pesquisa e experimenta novas técnicas de ensino e sugere formas de comportamento a serem adotadas no processo da instrução. Correlaciona-se a outras, em especial à Psicologia, Sociologia, Filosofia e Biologia.
Como toda ciência, a Didática é aberta às novas descobertas que enriquecem o saber humano. Assim, a Didática contemporânea faz ver ao educador certos conceitos novos ou novas abordagens desses conceitos, por isso é sempre importante para o educador estar se reciclando, enriquecendo-se.
A instrução é um conjunto de eventos planejados pelo professor com o fim de iniciar, ativar e manter a aprendizagem.
A aprendizagem consiste em uma mudança no comportamento do aluno em face do processo da instrução e é o resultado desse processo que, para ser eficiente, precisa ser planejado.
O planejamento da instrução é um processo de tomada de decisões que visam à racionalização das atividades do professor e do aluno, na situação de ensino-aprendizagem. Este planejamento envolve, pelo menos, três fases: elaboração, execução e avaliação.
A fase de elaboração compreende quatro etapas: formulação dos objetivos, seleção dos conteúdos, seleção das estratégias e seleção das formas de avaliação da aprendizagem.
Na fase de execução, aplicam-se as estratégias instrucionais na situação de ensino-aprendizagem e, na fase de avaliação, verifica-se o atingimento ou o não-atingimento dos objetivos, de sorte a reelaborar o planejamento, caso isto seja necessário.
O planejamento da instrução é tarefa obrigatória do professor, que oferece maior segurança para o atingimento dos objetivos e verificação da qualidade e quantidade do ensino que está sendo orientado.
Aluno é o componente básico do processo de instrução, pois é ele quem aprende. Ao professor cabe a função de planejar o ensino, propiciando condições para que a aprendizagem se realize.
A aprendizagem é o resultado do processo da instrução e consiste em uma mudança no comportamento do aluno em face do processo de instrução.
Instrução, por sua vez, é um conjunto de eventos planejados para iniciar, ativar e manter 
a aprendizagem.

Prática de Ensino

De todas as atividades da sociedade, o magistério foi a que mais sofreu deteriorações. O professor foi vítima da falta de compreensão, por parte das autoridades governamentais, do papel que desempenha na sociedade. Ensinar quer dizer guiar, estimular e orientar o processo de aprendizagem. A transmissão do ensino não pode ser conformista e acomodada. Deve ser um esforço pessoal e técnico, competente no seu trabalho específico. O ensino deve despertar o interesse pelo conhecimento e estimular o impulso natural de aprender.
O problema da formação do professor do Ensino Fundamental e Ensino Médio é da maior seriedade. Os professores das séries iniciais têm seus conhecimentos pedagógicos prejudicados porque os cursos de Pedagogia ( Art. 64 da Lei 9394/96 ) não são ministrados com a necessária profundidade e atualização. Com isso, o aprendizado ficou comprometido e a escola tornou-se passiva e enfadonha. As fontes de motivação dos alunos e dos professores foram aos poucos minguando.
A parte mais nobre e fundamental da educação, que é o contato direto e íntimo com a criança, foi desvalorizada. Não é menos verdade que os professores aceitaram com relativa passividade a degradação da qualidade do ensino, da sua renda e prestígio social, assim como não demonstraram interesse em desenvolver suas aptidões e capacidades. Por outro lado, o educador é sempre movido pelo ideal de servir.
Este artigo visa conscientizar o educador da grandeza de sua profissão para que atue como incentivador de idéias. Para o professor consciente de seu papel de protagonista no processo educacional, leva à reflexão sobre a importância de colocar suas habilidades em prol do aluno.
Este estudo surgiu da observação dos aspectos legais, da atuação como docente da Educação Básica e Universitário. A partir desta observação, constata-se que as deficiências do professor em sala de aula são múltiplas e refletindo sobre a atuação deste profissional procuramos literaturas pertinentes a metodologia e prática de ensino, tais como: decretos, leis, pareceres, resoluções, indicações, deliberações, livros didáticos e paradidáticos, revistas e jornais especializados, artigos, ensaios e materiais pedagógicos, bem como relatos de profissionais na área de educação, alunos e pais, que possibilitaram o entendimento e a reflexão na concepção deste trabalho. É um trabalho didático porque discute a postura do professor em sala de aula, explica uma metodologia e sugere atividades. A instrução não pode ser mecânica e arbitrária. É preciso que ajudemos a criança a encontrar significado no aprendizado. Sendo assim, o professor deve adotar procedimentos facilitadores da aprendizagem.
A aula expositiva tem sofrido sérias restrições como principal recurso da educação bancária: o professor - que é quem sabe - transmite o seu saber e o aluno - quem tem que aprender - recebe passivamente o conhecimento.
O professor consciente, que quer estabelecer um outro tipo de relação com o aluno, pode fazê-lo mesmo usando a técnica da aula expositiva. Muitos fatores podem auxiliar o professor a desenvolver a técnica de uma forma dinâmica, em que haja trocas de experiências entre todas as pessoas envolvidas: conhecimento da matéria, estímulo à atenção, linguagem didática, concretização das idéias e observação do aluno, portanto a aula expositiva pode ser enriquecedora e dinâmica desde que o professor conheça bem o conteúdo, consiga prender a atenção dos alunos, utilize a linguagem didática com todos os seus recursos, procure tornar as idéias concretas e, o mais importante, certifique-se de que os alunos estão aprendendo realmente - que é a proposta deste artigo.
(*) é professor universitário, jornalista e escritor.


ATIVIDADE - individual para entregar:

Pesquise o que é para Libâneo:

a) O plano da escola;
b) O plano de ensino;
 c) O plano de aula.
 
  Obs.: Fonte para pesquisa - Livro intitulado "Didática" de mesmo autor ou resuno do livro no site - http://www.pgie.ufrgs.br/alunos_espie/espie/max/public_html/didatica.htm

segunda-feira, 20 de fevereiro de 2012

3ºAno - DIA 29/02/2012 - Prática de ensino 
Profa. Cris

      Alunas, escolham 2 ou 3 dos temas abaixo apresentados e, conforme nossa última aula faça uma pesquisa reflexiva - que tenha o conteúdo pesquisado e seja pensado e explicado com suas palavras. Você poderá encontrar estes assuntos em vários dos livros da nossa biblioteca e em sites confiáveis (preferencialmente de universidades e centros de pesquisa). É uma atividade INDIVIDUAL, então, mesmo os temas sendo os mesmos, não terão as mesmas palavras, pois cada um deve expressar seus próprios conhecimentos e reflexões! Deve ser redigido à Caneta e entregue à pedagoga Cleonice nesta tarde. Mínimo de 3 páginas. Atrasos não serão tolerados. Mantenha o foco e quando não puder se concentrar, procure não atrapalhar sua colega. Tome um pouco de água e dê um tempinho ao seu cérebro, na sequência você voltará a pensar melhor e vai produzir um texto com qualidade. Bom Trabalho!!!

Áreas para pesquisa:
  • Assistência
  • Criança pobre
  • História da infância/criança (como objeto central)
  • Negritude / escravidão / crianças negras
  • História da legislação referente à infância / aspectos jurídicos
  • Criança abandonada
  • Políticas públicas voltadas à infância / criança
  • Roda dos expostos
  • Trabalho infanto-juvenil
  • Representação da infância / criança na literatura
  • Bibliografias sobre infância/criança
  • Criança e família
  • Higienização / puericultura / pediatria
  • História da escola / educação
  • Criança em situação de rua
  • Marginalidade / infratores / delinqüência / “desviante” / “transviado”
  • Instituições religiosas / Igreja e criança
  • Violência contra a infância / criança
  • Criança “problema” / “anormal” / “excepcional”
  • Arquitetura / urbanismo
  • Brinquedo / brincadeira / recreação
  • Criança indígena
  • Sociologia histórica
  • História das idéias sobre infância
  • Gênero
  • Memória
  • Pensadores / teóricos da infância
  • Prostituição infantil / pedofilia
  • Psicologia e criança / infância
  • Comemorações e festejos
  • Crianças da “elite”
  • Crianças na guerra / recrutamento de crianças
  • Demografia histórica

Histórico da Infância e família no Brasil (3º ANO - Prática de ensino)

O CUIDADO ÀS CRIANÇAS PEQUENAS NO
BRASIL ESCRAVISTA


                                                                                 Maria Vittoria Pardal Civiletti
                                      Quem me dera lembrar da teta negra de
                                      minh’ama de leite... (“Infância”, Manuel
                                      Bandeira, 1886-1968).


   Até 1888 a questão da creche emergirá como fruto da relação figura/fundo
mulher branca/mulher negra. Sendo a nossa unidade de trabalho textos de época,
serão feitas citações que, ressuscitadas, algumas vezes falarão por si mesmas.
MENTALIDADE A RESPEITO DA FUNÇÃO MATERNA E DA FAMÍLIA
Em fins do século XIX, os índices de mortalidade infantil eram naturalmente
mais alarmantes do que os atuais e foram alvo de estudo dos higienistas do
Segundo Império. Entre l845 e 1947, o Dr. Haddock Lobo observava que 51,9%
da mortalidade total era de crianças de 1 a 10 anos de idade (Costa, 1979, p.
162). A morte da criança não era entretanto vivenciada com muito sofrimento,
devido à identificação da criança morta como o “anjinho, puro e ainda intocado
pelo pecado”. Luccock, comerciante inglês que esteve cerca de dez anos no
Brasil, entre 1808 e 1818, relatou a seguinte cena:
Em uma das ocasiões foi ouvida uma mãe, que assim se exprimia: “Ó como
estou feliz! Ó como estou feliz, pois que morreu o último dos meus filhos.
Que feliz estou. Quando eu morrer e chegar diante dos portões do céu,
nada me impedirá de entrar, pois que ali estarão cinco criancinhas a me
rodear e a puxar-me pela saia exclamando: “Entra Mamãe, entra!” Ó que
feliz que sou!”, repetiu ainda, rindo a grande. Se isso fosse um exemplo
isolado de sentimentos maternais estranhos, poderia ser considerado efeito
de um desvio mental passageiro; o caso, porém, é que a satisfação em tais
momentos é geral demais, e por demais ostensiva, para que deixe lugar à
desculpa dessa espécie. (Luccock, 1975, p. 80)
A conotação angelical da criança era válida tanto para brancos quanto para
negros. Se a mortalidade era alta entre as crianças brancas, o que dizer das
condições de sobrevivência das negras? A escrava parturiente retornava
geralmente ao trabalho em cerca de três dias. Adalberto da Prússia relata visita a
uma senzala em 1842:
Uma negra estava deitada em sua esteira de junco amamentando o seu
negrinho a quem dera à luz a noite anterior. ‘Dentro de dois dias voltará ao
trabalho’, disse o Doutor ao Conde de Bismark, a quem devo este relato
(...). (Adalberto da Prússia, 1977, pp. 85-86)
Já em 1822, José Bonifácio colocava, no art. 18 de seu projeto de lei, uma
“Representação à Assembléia Nacional Constituinte do Brasil sobre a
Escravatura”:
A escrava durante a prenhez, e passado o 3º mez, não será obrigada a
serviços violentos e aturados; no 8º mez só será ocupada em casa, depois
do parto terá um mez de convalescença, e passado este, durante um ano
não trabalhará longe da cria. (apud. Moncorvo Filho, 1926, p. 80)
A julgar pela data do relato do príncipe Adalberto (1842), o projeto de lei de
José Bonifácio não foi colocado em prática.
Para sobreviver, portanto, a criança escrava era incorporada ao trabalho da
mãe. Walsh, que esteve no Brasil entre 1828 e 1829, descreve, nas proximidades
de Irajá:
Em um grande terreno lavrado, no meio deste anfiteatro verde, estavam de
oitenta a cem negros dos dois sexos; alguns deles com bebês amarrados
nas suas costas em fila cavando a terra com enxadas para plantio. (Walsh,
apud Mott, 1979, p. 60).
Outros viajantes também falam do hábito das negras amarrarem os filhos
às costas a fim de conciliar o trabalho com os cuidados à criança. Kidder, entre
1873 e 1840, descreve esse hábito entre as lavadeiras das Laranjeiras, Ewbank,
em 1846, aponta-o entre as vendedoras e as oleiras.
Nesta fazenda fazem-se tijolos e telhas em grande quantidade. Sob um
telheiro estavam negras jovens e maduras, quase completamente nuas, só
com uma tanga e algumas com crianças presas às costas, inclinadas sobre
bancos e pondo o barro em moldes, e tendo os braços e as pernas
cobertas e as faces marcadas por ele. (Ewbank, 1976, p. 80)
Sá de Oliveira publicou em 1895 um trabalho sobre os efeitos das
condições de trabalho do negro, em seu desenvolvimento físico. Sobre o hábito
de atar por longos períodos as crianças às costas, diz:
(...) vêem mais tarde os seus filhos ficarem com as pernas defeituosas,
arqueadas, de modo que, tocando-se os pés, formam uma elipse alongada.
(Sá de Oliveira, 1895, apud Freyre, 1975, p. 359)
O hábito de levar os filhos às costas durante viagens ou pequena parte do
dia era amplamente utilizado na África, como também entre nossos índios. As
deformações encontradas por Sá de Oliveira, portanto, eram fruto de uma
deturpação de um hábito cultural preexistente. Esse autor detectou também uma
grande incidência de achatamento da região occipital do crânio, devido ao hábito
das mães deixarem as crianças deitadas todo o dia, que era o caso das escravas
que não as podiam levar às costas.
Brandão Júnior refere-se a uma invenção engenhosa de um fazendeiro do
Maranhão, que obrigava as escravas a deixarem seus filhos, crianças ainda de
mama, no tejupabo – buraco cavado na terra onde a criança era colocada até a
metade do corpo. (apud Freyre, 1975, p. 359)
O destino dos filhos das escravas escolhidas para servir como amas-deleite
era muitas vezes a Roda. Tratar-se-á especificamente da questão mais
adiante.
A criança escrava que freqüentava a casa-grande desfrutava melhores
condições de vida, tendo mesmo alguns viajantes descrito sua relação com o
senhor como afetuosa. Para Debret, entretanto, as crianças eram consideradas
como espécie de bichinhos domésticos (Debret esteve aqui entre 1816 e 1831):
(...) os dois negrinhos, apenas em idade de engatinhar e que gozam, no
quarto da dona da casa, dos privilégios do pequeno macaco, experimentam
suas forças na esteira da criada (...). (Debret, 1978, p.185)
No Rio, como em todas as outras cidades do Brasil, é costume, durante o
‘tête-à-tête’ de um jantar conjugal que o marido se ocupe silenciosamente
com seus negócios e a mulher se distraia com os negrinhos que substituem
os doguezinhos, hoje quase completamente desaparecidos na Europa.
Esses molecotes, mimados até a idade de cinco ou seis anos, são em
seguida entregues à tirania dos outros escravos que os domam a
chicotadas e os habituam assim a compartilhar com eles as fadigas e
dissabores do trabalho. (Debret, 1978, v.1, p. 185)
Mott (1979) detectou que, nos relatos dos viajantes, a idade de 5 a 6 anos
parece encerrar uma fase na vida da criança escrava. De 6 a 12 anos ela aparece
desempenhando alguma atividade, geralmente pequenas tarefas auxiliares. Dos
12 em diante as meninas e meninos escravos eram vistos como adultos, no que
se refere ao trabalho e à sexualidade. Rugendas, entre 1821 e 1825, relata,
referindo-se às fazendas do clero:
(...) até a idade de doze anos as crianças não são obrigadas a trabalhar;
apenas limpam os feijões e outros cereais destinados à alimentação dos
escravos ou cuidam dos animais e executam pequeninos trabalhos
domésticos. Mais tarde, as moças e os rapazes são encaminhados para os
campos. Quando um menino mostra disposições especiais para
determinado oficio, é-lhe este ensinado, a fim de que o pratique na próxima
fazenda. (Rugendas, 1976)
A partir dos seis anos iniciava-se, para o menino branco, o aprendizado do
latim, da gramática, das boas maneiras, nos colégios religiosos. A vara de
marmelo e a palmatória se incumbiam de transformar o antigo “anjinho” numa
miniatura de adulto precoce. Dr. Rendi, médico francês que visitou o Brasil em
princípios do século XIX, assustou-se com a precocidade dos meninos. Em seus
Études topographiques, medicales et agronomiques sur le Brésil, assinala:
Aos sete anos o jovem brasileiro já possui a gravidade de um adulto; ele
passeia majestosamente, uma bengala na mão, orgulhoso de um vestuário
que faz com que se pareça mais com as marionetes de nossas feiras que
com um ser humano. (2)
Fletcher, vinte e poucos anos depois, compartilha da mesma opinião a
respeito do menino brasileiro:
ele se torna um homenzinho velho antes de ter doze anos de idade, com
seu chapéu preto cerimonioso, colarinho duro, e na cidade anda como se
todos estivessem olhando para ele e como se estivesse envolvido por um
espartilho. Ele não corre, pula ou atira pedras como os meninos da Europa
ou da América do Norte.(3)
Pode-se notar que a mentalidade a respeito da infância no Brasil, durante o
período escravista, em muito se aproxima da descrição feita por Ariès (1879) e
Badinter (1985), da situação da criança na França no Antigo Regime. Logo após
um primeiro período de extrema fragilidade, marcado pelos altos índices de
mortalidade e pouco investimento afetivo, a criança é incorporada ao mundo
adulto. A estranheza demonstrada por Rendu e Fletcher em meados do século
XIX indica que, por esse período, uma nova mentalidade a respeito da infância já
se havia implantado na Europa.
(2) À sept ans le jeune brésilien a déjà la gravité d’un adulte; il se promène mejestueusement, une bandine à la main, fier d
'une tiolette qui le fait plutôt resembler aux marionettes de nos foires qu’à un être humain (Rendu, apud Freyre, 1975, p.
411).
(3) He is made a litte old man before he is twelve years old of age, havind his stiff blanck hat, standing collar and in the city
he walks as if everybody were looking at him and as if he were encased in corset. He does not run or jump or play roops or
throw stones as boys in Europe and North America (Fletcher, apud Freyre, 1975, p. 411).
Cabe salientar as diferenças encontradas entre a criança negra e a criança
branca e entre meninos e meninas.
Na primeira infância, até os 6 anos, a criança branca era geralmente
entregue à ama-de-leite. O pequeno escravo sobrevivia com grande dificuldade,
precisando para isso adaptar-se ao ritmo de trabalho materno. Após esse
período, brancos e negros começavam a participar das atividades de seus
respectivos grupos. Os primeiros, dedicando-se ao aprimoramento das funções
intelectuais, e os segundos, iniciando-se no mundo do trabalho ou no aprendizado
dos ofícios.
Se, para o "anjinho", naturalmente assexuado, era irrelevante ser menino
ou menina, após os seis anos apenas os meninos freqüentarão os colégios ou
aprenderão um ofício. As referências à mesma negra salientam apenas sua
sexualidade. Schlichthorst descreve, em 1825-1826:
Doze anos é a idade em flor das africanas. Nelas há, de quando em
quando, um encanto tão grande que a gente esquece a cor. As negrinhas
são geralmente fornidas e sólidas, com feições denotando agradável
amabilidade e todos os movimentos cheios de graça natural, pés e mãos
plasticamente belos. Lábios vermelho-escuros e dentes alvos e brilhantes
convidam ao beijo. Dos olhos se irradia um fogo tão peculiar e o seio arfa
em tão ansioso desejo que é difícil resistir a tais seduções. Até o digno
Clapperton muitas vezes compartilhou as mesmas sensações que me
assaltavam no momento, sem disso se envergonhar. Por que deverei eu
me deixar influenciar pela soberba européia e negar um sentimento que
não se originava em baixa sensualidade, mas no puro agrado causado por
uma obra-prima da criação? A menina que se achava à minha frente era, a
seu modo, uma dessas obras-primas da criação, e para ela eu me podia
servir das palavras em inglês: a beautiful negro lady. (4) (Schlichtorst, 1943,
p. 203-4)
O aspecto materno da condição feminina durante esse período não possuía
uma valorização social especial, já que seu objeto, a criança pequena, também
não a tinha. Cabia à criança apenas vencer o desafio de sobreviver, para ser,
logo que possível, incorporada ao mundo adulto. Essa situação se transformará a
partir do momento em que a criança e a mãe entram na mira do movimento
higienista.
Analisar-se-ão a seguir dois aspectos específicos relativos à situação da
primeira infância: a Roda e sua relação com a questão da amamentação.
(4) Uma bela dama negra.
A RODA DOS EXPOSTOS
A Casa dos Enjeitados, Casa dos Expostos, Casa da Roda ou,
simplesmente, Roda existia em quase todos os países do mundo nos séculos
XVIII e XIX. Lallemand, em 1885, escreveu um histórico do atendimento à infância
abandonada desde o antigo Egito, além de realizar um levantamento sobre a
situação deste atendimento nos cinco continentes, na época. Acusa a existência
de Casas dos Enjeitados em quase todos os países da América do Sul, dentre
eles o Brasil. Segundo Lallemand, a primeira Casa dos Expostos existente em
nosso país foi fundada pelo vice-rei, em 1726, em Salvador. O nome Roda, pelo
qual tornou-se mais conhecida, deve-se à assimilação da instituição ao dispositivo
onde eram depositadas as crianças. Trata-se de um cilindro cuja superfície lateral
é aberta em um dos lados e que gira em torno de um eixo vertical. O lado fechado
fica voltado para a rua. Uma campainha exterior é colocada nas proximidades.
Se uma mulher deseja entregar um recém-nascido, ela avisa à pessoa de plantão
tocando a campainha. Imediatamente, o cilindro, girando em torno de si mesmo,
apresenta para fora o seu lado aberto, recebe o recém-nascido e, continuando o
movimento, leva-o para o interior.
Em 1738, Romão Mattos Duarte funda a Casa dos Expostos do Rio de
Janeiro. Em 1882, ao apresentar o atendimento realizado no Brasil à infância
abandonada no Congrés Internacional de la Protection de l'Enfance, Araujo (1883)
acusa a existência de Rodas em quase todas as províncias brasileiras.
As crianças entregues à Roda eram geralmente encaminhadas para
famílias que as criariam mediante pagamento da instituição. Teoricamente, dos
13 aos 18 anos os expostos receberiam das famílias um salário para trabalhar, e
os que fossem devolvidos à Casa da Roda iriam, no caso dos meninos, para o
Arsenal de Guerra, a Escola de Aprendizes Marinheiros (fundada Governo em
1873) ou para as oficinas do Estado. As meninas iriam para o recolhimento das
órfãs, até saírem casadas (apud Cony, s.d.).
Na realidade, porém, os índices de mortalidade eram enormes e pouco se
sabia do destino dos sobreviventes, como se pode perceber pela fala de D. Pedro
I à Assembléia Constituinte de 1823:
A primeira vez que fui à “Roda dos Expostos”, achei, parece incrível, sete
crianças com duas amas; nem berços, nem vestuário. Pedi o mapa e vi
que em treze annos tinham entrado perto de doze mil e apenas tinham
vingado mil, não sabendo a Misericórdia verdadeiramente onde ellas se
acham (...) (apud Moncorvo Filho, 1926, p. 36).
Os usuários da Roda eram basicamente os filhos das escravas. Estas
muitas vezes a utilizavam na tentativa de livrá-los da escravidão. Para tal,
qualquer estratégia era válida, incluindo a morte. Walsh, segundo Mott (1979), nos
relata, nos anos de 1828-1829:
Esse horror à escravidão é tão grande, que eles não só se suicidam como
também matam seus filhos para escapar dela. As negras são conhecidas
como sendo ótimas mães (...) mas este mesmo amor freqüentemente as
leva a cometer infanticídio. Várias delas, sobretudo as negras Minas, têm a
maior aversão e ter filhos e provocam aborto, precavendo-se, assim, contra
o desgosto de dar a vida a escravos.
Dentro deste contexto, colocar o filho na Roda representava uma
esperança.
A Roda recebia crianças de qualquer cor e preservava o anonimato dos
pais. A partir do alvará de 31 de janeiro de 1775, as crianças escravas colocadas
na Roda eram consideradas livres (Mott, 1979). Na prática, contudo, isso nem
sempre acontecia. Maria Graham narra em 1821-1823:
Fui ao asilo de órfãos que é também o hospital dos expostos. Os rapazes
recebem instrução profissional em idade adequada. As moças recebem um
dote de 200 mil réis que, apesar de pequeno, as ajuda a estabelecerem-se
e é muitas vezes acrescido por outros fundos (...) Dentro de pouco mais de
nove anos foram recebidas 10.000 crianças: estas eram dadas a criar fora,
e de muitas nunca mais houve notícias. Não talvez porque todas tinham
morrido, mas porque a tentação de conservar uma criança mulata como
escrava deve, ao que parece, garantir o cuidado com sua vida (...).
(Graham, 1956, p. 345)
A Roda era também amplamente utilizada pelos proprietários que não
queiram se responsabilizar pelos encargos da criação da prole de seus escravos.
Livrar-se do pequeno estorvo era tão mais importante quanto se desejasse da
escrava um trabalho que tornasse incompatível a manutenção do filho junto a si.
Esse era sem dúvida o caso da polêmica pratica do aluguel da ama-de-leite.
Gilberto Freyre, em Casa-Grande & Senzala (1975), atribui à herança
portuguesa o hábito das mães ricas não amamentarem seus filhos. Enquanto em
Portugal essa função era delegada a mulheres mais humildes, no Brasil coube às
escravas negras amamentar as crianças brancas. A partir da Segunda metade do
século XIX, essa prática tornou-se alvo de violentas críticas, principalmente, por
parte dos médicos higienistas. Um belo exemplo de propagação das idéias
abolicionistas junto ao público feminino é o folhetim “A Mãi Escrava”, publicado de
novembro de 1879 a maio de 1880 no jornal A Mãi de Família e assinado por
Solrac (as citações que se seguem foram retiradas dessa publicação):
,
Vamos referir a historia de uma mãi escrava, história que infelizmente
tantas vezes se reproduz e que é a origem de muitas desgraças
domésticas sociais. (nov.1879, p. 165)
O conto começa com a descrição de um palacete:
Em todos os mezes eram abertos os seus salões para bailes, concertos,
representações teatrais, etc., etc. (...) Vamos penetrar no interior do
palacete do Sr. T., em uma noite em que em seus salões reina a alegria,
imperam a belleza natural e a do carmim, pó de arroz, etc.(...). (nov. 1879,
p. 174, grifado no original)
Na senzala, Clara, uma jovem escrava, tinha seu primeiro filho. Tendo tido
problemas no parto, outra escrava, Rosaura, chama os senhores na festa. A Sra.
T., irritada por ter sido solicitada ao quarto da parturiente, trava com Clara o
seguinte diálogo:
— Bem — Voltando-se para Rosaura, disse: Diga ao cocheiro que leve esta
criança para a Roda... Clara ergueu-se e pôz-se de joelhos na cama —
Nhã-nhã, é meu primeiro filho, me deixe comigo — Já disse. A Sra. T., ao
proferir, ia sahindo. (nov. 1879, p. 174)
Clara desmaiou e a Sra. T. voltou para a festa. A escrava é então alugada
como ama-de-leite para um casal bondoso, cujo marido havia recolhido uma
pequena enjeitada na Roda. O Sr. C. entrega a Clara duas crianças para serem
amamentadas, deixando claro entretanto que: “Clara, has-de dar de mamar a
minha filha de 2 em 2 horas e à outra 3 vezes por dia” (jan. 1880, p. 7). A escrava,
comovida com a visão da negrinha que lhe lembrava sua filha, chora muito. Por
insistência dos amos, conta o que houve, e o Sr. C. acaba descobrindo que o
“feliz acaso reunia sob o seu teto a mãi e a filha”. A Sra. C., entretanto; “quis
guardar o silêncio em relação a Clara para que a amamentação de sua filha
nada sofresse”.(fev. 1880, p. 23, grifado no original)
A desconfiança de Clara de ser a criança negra sua filha leva-a a dedicarse
muito à menina, em detrimento da criança branca. A Sra. C., percebendo isto,
afasta a criança negra da casa, alugando uma escrava para cuidar dela. Clara
revolta-se profundamente, o que chega ao conhecimento do Sr. C., que tem, uma
discussão com a mulher:
Mas estás louca, minha filha, disse o Sr. C., pois tu não és mãi? Não
comprehendes que não se podem sufocar sentimentos d’essa ordem! Não
comprehendes também que assim sacrificastes o nosso socego e a saúde
de nosso filho!
E agora o que fazer?
Negros são sempre negros, respondeu a Sra. C. Não duvido que ella
estime seu filho; mas também agora são exagerações; porque talvez
espere algum beneficio... O melhor é fallar com a senhora que não é de
graças e ella lhe fará chegar a ordem. (mar.1880, p. 47)
O conto tem um final dramático. Clara, desesperada, foi procurar um
feiticeiro para descobrir onde estava a filha. “O que passou, bem podem avaliar
todos os que conhecem a malvadez estúpida e a credulidade fanática dos
africanos” (maio 1880, p. 179). O Pai Quilombo aconselha Clara a envenenar
nhô-nhô e fugir com sua filha. "seu coração naturalmente bom arredou-a d'esse
infame propósito" (maio 1880, p. 79). Clara no entanto foge, acaba encontrando a
filha e, fora de si, suicida-se junto a ela.
O que devemos accrescentar a esta história de todos os dias?
É que a nuvem negra que empana o brilho do sol de nossa Pátria só
poderá dissipar-se com o sôpro benefico da Emancipação dos escravos!
(maio 1880, p. 79, grifado no original)
O tom abolicionista do conto garante o final autodestrutivo da escrava, que
não mata nhô-nhô, ao mesmo tempo que apavora as senhoras o suficiente para
os riscos que envolvem as amas-de-leite.
A critica dos higienistas à utilização da Roda e das amas-de-leite tinha um
objetivo claro: reformular a conduta das mulheres das classes abastadas em face
dos filhos. Recriminar as mães inconscientes que “esquivando-se ao cumprimento
da nobre e sublime tarefa a ellas imposta pela natureza” entregavam os filhos a
outras mulheres.
(...) sem educação, de hábitos péssimos; as escravas, mesmo tendo em
sua companhia seus próprios filhos, não obstante a mais solicita vigilância,
maltractão os recém-nascidos que lhes são entregues para criar
apresentando além disso o grande inconveniente de incutir maos hábitos
nas crianças confiadas aos seus cuidados. (Azevedo, 1873, p. 67)
Por trás da crítica à colocação do pequeno escravo na Roda,
(...) a fim de que o ambicioso e despótico senhor obtenha pela escrava-ama
um salário maior depois de pretender negar-lhe até o instincto da
maternidade, que a natureza implantou nos próprios irracionais (...)
(Azevedo, 1873, p. 67)
encontramos a preocupação com a conduta das famílias abastadas, verdadeiro
objetivo da filantropia higiênica. Zamith nota, em 1869:
Há um fato muito conhecido entre nós, e é o seguinte: há certos senhores
que tem o costume de mandar pôr os filhos de suas escravas na roda para
que obtenham melhor aluguel. Este fato, que parece à primeira vista de
pouca importância, influi sobremaneira no moral da escrava, de modo que
ela com a lembrança do filho nunca poderá nutrir bem outra criança.
Algumas há que apesar de terem consigo o seu filho, maltratam a criança
que têm obrigação de criar, porque foram alugadas ou servem contra a
vontade. E não obstante toda a vigilância que as mães empregam, elas
não cuidam das crianças como devem. (Zamith, apud Costa, 1979, p. 167,
grifo meu)
Através da denúncia dos efeitos deletérios da ama negra sobre a criança,
os higienistas iniciam uma cruzada em prol da reeducação física, moral e
intelectual da mãe burguesa. O resultado desta campanha educativa foi a
instauração do ideal da mulher-mãe, tão bem descrito e analisado por Costa
(1979).
Se a Lei do Ventre Livre (1871) provocou uma pequena diminuição no
numero de expostos, após a abolição a quantidade de crianças colocadas na
Roda cai vertiginosamente. No Jornal do Comércio de 2 de julho de 1899, o Dr.
Pires de Almeida assina um artigo sobre “A Santa Casa da Misericórdia do Rio de
Janeiro”, onde apresenta um quadro no movimento da Casa dos Expostos desde
sua fundação (1738) até a data do artigo (1899). Nestes 161 anos, a Misericórdia
atendeu a 42.937 enjeitados. De 1738 a 1763 encontramos uma média de 46,3
crianças por ano. De 1763 a 1810, 131; de 1810 a 1863, 295,7; de 1836 a 1871,
562,5; de 1871 a 1888, 399,1; e finalmente, de 1888 a 1889, a Roda atendeu a
124,9 crianças por ano em média. Podemos, portanto, verificar que o período de
maior utilização da Roda foi de 1836 a 1871. A queda observada após esta data
deve-se provavelmente à Lei do Ventre Livre e a campanhas abolicionistas, como
a desenvolvida pelo citado conto de Solrac (1879). É somente, porém, com a
Abolição que esta prática entra em franco declínio.
CONTROVÉRSIA SOBRE A MAMADEIRA
As críticas às amas-de-leite desembocam numa nova e polêmica discussão
– a dos perigos e benefícios do uso da mamadeira. A julgar pelo desacordo dos
médicos na época, as mães da virada pelo século viveram uma profunda confusão
a respeito de como melhor alimentar seus bebês.
Azevedo (1873) justifica a necessidade da utilização do aleitamento artificial
direto – em fêmeas de animais e sobretudo fêmeas humanas – pela dificuldade de
conservação do leite no clima quente. O autor invoca, porém, às mães “que
somente entreguem seus filhos e amas mercenárias quando lhes for
absolutamente impossível alimentá-las com seu próprio leite” (Azevedo, 1873, p.
68).
Em 1875 parece surgir uma solução para o problema da conservação do
leite. Henrique Nestlé, químico de Vevey, na Suíça, introduz no Brasil a farinha
láctea (Nestlé, 1875). A Junta Central de Higiene Pública do Rio de Janeiro,
presidida pelo Barão do Lavradio, fornece, naquele ano, parecer favorável à
introdução do produto no mercado. Em sua defesa, a Nestlé utiliza argumentos
pouco comuns num Brasil escravista.
Uma das principais causas da grande mortalidade das crianças de peito é a
nutrição insalubre.
Nos primeiros meses o leite da mãi será sempre a alimentação mais
natural, e toda a mãi deve amamentar seu filho por si mesma, no caso de o
poder fazer; fazendo-se substituir por uma ama-de-leite, ella não somente
falta ao seu dever, mas também obriga a proceder da mesma forma
aqquela que abandona o seu próprio filho para amamentar o de outrem.
Confiar um filho a uma pessoa estranha, cujo procedimento nos não é bem
conhecido, é aventurar muito, e bastantes vezes recebe o menino o gérmen
de numerosas moléstias como o leite de sua mãi mercenária.
Sob o ponto de vista christão, não é admissível que o filho do pobre seja
preterido pelo filho rico (...)
(...) Deve-se, pois, procurar uma alimentação própria para a cria quando
falta o leite da mãi. (Nestlé, 1875, p.1)
A farinha láctea é composta de leite em pó e pó de pão torrado. Mistura-se
com água imediatamente antes de tomar.
O folheto segue com depoimentos de vários médicos estrangeiros
elogiando a farinha láctea e a contribuição da Nestlé para acabar com o “peito
alugado” das amas-de-leite. Um dos testemunhos é do Dr. Fridenger, diretor da
maternidade e do asilo de enjeitados de Viena, que a estava utilizando com os
expostos, com sucesso.
Para que a farinha láctea tivesse aceitação no Brasil, entretanto, era
indispensável que a mamadeira, veículo através do qual ela seria administrada,
fosse também aceita.
Em março de 1882, o periódico A Mãi de Família publica o artigo “As
Mamadeiras Envenenadas”. Uma vez que sempre haveria uma percentagem de
mães que não poderiam amamentar, e considerando-se as severas críticas de que
o aleitamento mercenário era alvo, a mamadeira constituía uma opção. O dito
periódico situa em 1782 a primeira invenção de um aparelho parecido com a
mamadeira, por um médico italiano, onde um vaso servia de seio e a esponja fazia
o papel de bico. O artigo é enfático a respeito dos perigos com a falta de higiene
na utilização da mamadeira. Alerta as mães a fervê-la e informa que, de cada
quatro crianças alimentadas artificialmente, morre pelo menos uma e as outras
arriscam-se a ficar raquíticas, sendo a causa mais provável a mamadeira.
Um ano depois, um março de 1883, o mesmo periódico publica outro artigo
sobre o assunto intitulado “A Mamadeira”. Nele, define-se veementemente como
auxiliar para o desmame e como substituta para a ama-de-leite:
Esta maneira de criar, que chamarei e amamentação razoável ou
amamentação mixta e que lamento não ver mais geralmente adaptada,
permitira, creio eu, a um grande número de senhoras criar seus filhos, e
com grande vantagem para sua própria saúde.
Reconhece, entretanto, que há muito preconceito contra esta idéia na
época. “Há poucos dias ouvi um colega meu dizer: “Todas as vezes que encontro
uma mamadeira em casa dos meus clientes, atiro-a à rua”.” O artigo termina
dizendo:
Que todas as mãis, que todas as amas me ouçam: que cessem de ter
horror a mamadeira e comecem sempre a servir-se dellas para seus filhos
na idade de quatro mezes. (grifado no original)
Mais um ano se passa, e em março de 1884 encontramos o artigo
“Mortalidade das Crianças’. Desta vez, o periódico se posiciona radicalmente
contra a mamadeira:
Chamo muito especialmente attenção das mãis para este facto: a
amamentação por meio da mamadeira augmenta muito as probabilidades
já tão numerosas de morte, na infância e, efetivamente, esse gênero de
alimentação occasiona, mais que nenhum outro, as moléstias do estômago
e dos intestinos, affecções de que succumbem muitas creanças.
Para as creanças criadas no seio a mortalidade é de 10 para 100 no
primeiro ano; é de 29 por 100 para as dadas a criar fora; é de 30 por 100
para as criadas com mamadeiras; e finalmente as estatísticas officiaes
indicam que é de 55 por 100 para os enjeitados. (A Mãi de Família, março,
1884)
Pode-se perceber que os médicos deixaram uma única opção segura para
a mãe: amamentar seu próprio filho. Enquanto todos eram unânimes a respeito
da contra-indicação da ama-de-leite, a mamadeira que um medico prescrevia era
atirada pela janela por seu colega. Se o primeiro artigo lhe era favorável, desde
que tomadas certas precauções, o segundo é francamente a favor e o terceiro
terminantemente contra. E todos faziam parte do mesmo periódico. Se levarmos
em consideração as condições higiênicas do Rio de Janeiro no fim do século
passado e a temperatura que a cidade atinge em certas épocas do ano,
poderemos considerar ter sido realmente provável a freqüência de infecção
intestinal apontada no terceiro artigo.
O fundamental, entretanto, é verificar que não havia a possibilidade de uma
opção socialmente aceitável que não fosse a do aleitamento materno. Mãe e filho
se pertenciam e entre eles não se deveriam interpor regras ignorantes ou objetos
suspeitos. Obviamente, o movimento higienista não defendia essa exclusividade
da díade mãe-filho apenas no período de aleitamento, estendendo-a por toda a
primeira infância. Mesmo dispensando a ama-de-leite, e cuidando pessoalmente
de seus filhos pequenos, a mulher das classes abastadas necessitava do trabalho
da escrava ou da ex-escrava para os demais serviços domésticos. Quando, a
partir de 1871, a Roda começa a ser menos utilizada, surge um novo problema: o
de fazer dos filhos das escravas e das criadas, a fim de liberá-las para o serviço
doméstico?
O SURGIMENTO DO DISCURSO SOBRE A CRECHE NO BRASIL
Em janeiro de 1879, o já citado periódico A Mãi de Família inicia uma série
de cinco artigos sobre a creche, escritos pelo Dr. K. Vinelli, médico dos expostos,
começando por defini-la:
A creche é um estabelecimento de beneficência que tem por fim receber
todos os dias úteis e durante as horas de trabalho, as crianças de dois anos
de idade para baixo, cujas mães são pobres, de boa conduta e
trabalham fora de seu domicilio. (A Mãi de Família, jan.1879, p. 3, grifo
meu)
O termo “creche” é tomado emprestado da língua francesa, onde também
designa presépio. Na realidade, não foram apenas as palavras crèche ou salle
d’asile que a França forneceu ao Brasil, mas toda a idéia de finalidade e
funcionamento destas instituições.
A implantação de creches na França é atribuída a Marbeau, nascendo a
primeira em 14 de novembro de 1844 (em 1801 a Marquesa de Pastoret havia
fundado uma creche com 12 berços, que teve porém curta duração). Na vigésima
sessão publica da Sociedade de Creche em Paris, em 13 de maio de 1877, o
imperador e a imperatriz do Brasil estavam presentes. No artigo primeiro do
Statut des Crèches temos sua definição, de onde foi tirada a versão brasileira:
Uma sociedade beneficente é estabelecida entre as pessoas caridosas que
desejam concorrer a fundar uma creche para crianças pobres de menos de
dois anos, cujas mães trabalham fora do seu domicilio e tenham uma
boa conduta (5).
Originadas do movimento filantrópico, as creches, as salas de asilo e
escolas primárias (6) têm como objetivo primeiro atender às classes populares.
Metz coloca isso claro no prefácio de seu livro:
(5) Une societé de bienfaisance est établie entre les persones charitables que voudraient bien concourir à fonder une
crèche pour les enfants pauvres âges de moins de deux ans, dont les mères travaillent hors de leur domicile et ont une
bonne conduite. Metz, 1879, p. 19, grifo meu).
(6) As creches se destinavam a crianças de 0 a 2 anos. As salas de asilo, a crianças de 2 a 7, e as escolas primárias
atendiam à faixa etária de 7 a 10 anos.
A instrução popular é neste momento a maior preocupação de todos os
governos fortes. Enquanto o povo só gozava de uma liberdade relativa, a
nobreza provia todas as suas necessidades. Não havia motivo de se
preocupar com o amanhã. Sua existência e a de sua família estavam
asseguradas. O povo, ignorante de tudo e não sabendo como se servir
desta arma terrível, a liberdade, entregou-se aos maiores excessos,
cometeu os maiores crimes, e não parou até que um governo forte e
poderoso colocou uma barreira a sua fúria (...) O governo compreendeu
que, para fazer do dever um culto, era necessário que a educação primária
fosse iniciada no berço, (7 e 8).
E com berços começaram as creches...
A segunda finalidade da creche é nitidamente liberar a mão-de-obra
feminina e melhorar o rendimento da masculina.
O regime de creches, ao melhorar a constituição da criança, lhe deu noites
longas e agradáveis e permitiu ao operário pai de família, fatigado de um
trabalho penoso, ter o descanso de que tanto necessita para retomar seu
trabalho cotidiano (9).
Para tal, a creche funcionava de 5:30h às 20:30h, fechando apenas aos
domingos e nos dias de festas, o que nos dá uma idéia de extensão da jornada de
trabalho na época. O Réglement des Crèches determina que a mãe pode
amamentar duas vezes ao dia, sendo o restante da alimentação ministrada por
mamadeira. A cada ama eram designadas cinco ou seis crianças e o artigo 8 reza
que “II sera defendu aux berceuses de laisser des personnes étrangères s’installer
dans la crèche”(10) (Mets, 1870, p. 23).
Também no Brasil a creche teve por finalidade liberar a mão-de-obra da
mãe pobre; no caso, o da escrava ou ex-escrava. O artigo da A Mãi de Família,
entretanto, não faz referência à figura paterna:
(7) Le regime des crèches en améliorant la constituion de l’éngant lui a donné des nuits longues et paisibles et a permis à
l’ouvrier père de famille, fatigué d’une pénible labeur, de goûter un repos dont il a si grand besoin pour reprendre son travail
quotidien. (Metz, 1870, p.6)
(8) L’instruction populaire est en ce moment la plus grande préoccupation de tous les gouvernements forts. Tant que le
peuple ne joiussait que d’une liberté relative, la noblesse subvenait à tous ses besoins. II n’avait point à se préoccuper du
lendemain. Son existence et celle de sa famile étaient assurées (...) Le people ignorant toutes choses et ne sachant
comment se servir de cette arme terrible, la liberté, se livra aux plus grands excès, commit les plus grand crimes, et ne
sárrêta que lorsqu’un gouvernement comprit que pour faire du devoir un culte, il fallait que l’éducation première fût
commencée dès le berceau (Metz.,1870, p. 1-2).
(9) Le regime des crèches en améliorant la constituion de l’énfant lui a donné des nuits longues et paisibles et a permis à
l’ouvrier père de famille, fatigué d’une pénible labeur, de goûter un repos dont il a si grand besoin pour reprendre son travail
quotidien. (Metz, 1870, p.6)
(10) “É proibido às crecheiras deixar pessoas estranhas se instalarem na creche”.
No Brasil ainda não existe a creche; entretanto, sua necessidade me
parece palpitante, sobretudo, nas actuais condições em que se acha o
nosso paiz depois da moralizadora e humanitária lei de 28 de setembro de
1871, em virtude da qual nelle não nasce mais um escravo. Agora que,
graças a iniciativa do governo e também, dos particulares em não pequena
escala, com a emancipação da escravatura vae desaparecendo o
vergonhoso estigma impresso na face do Brasil, estigma que a civilização
repelle e abomina, um grande numero de mulheres que quando escravas
trabalhavam para seus senhores que por sua vez eram obrigados a lhe dar
alimentação, domicilio e vestuário, a cuidar de sua saúde e da de seus
filhos, ganhando liberdade, vêem-se não poucas vezes abandonadas com
filhos pequenos, que ainda mamam, sem ter quem os sustente, na
indeclinável e urgente necessidade de procurarem pelo trabalho, ganhar os
meios da própria subsistência e da dos filhos e, em muitos casos, sem
poderem conseguil-o por que a isso as impedem como obstáculo
insuperável os filhos pequenos, que ellas não tem a quem confiar e cuja
tenra idade não lhes permite mandal-os para a escola. Não há senhora
alguma dona de casa, que ignore a extrema difficuldade senão
impossibilidade que encontra uma criada, por exemplo, em alugar-se
quando traz consigo um filho a quem amamenta (9). (A Mãi de Família, jan.
1879)
Com a criação da creche:
A mãe já não encontra dificuldade em empregar-se e pode então tranqüila
dedicar-se ao trabalho que lhe há de trazer os meios de manter-se. (A Mãi
de Família, jan. 1879)
O autor rebate as críticas que se poderiam levantar à creche. Quanto ao
prejuízo de saúde da criança pelo transporte diário, bastaria agasalhá-la bem. A
principal crítica, entretanto, referia-se ao afastamento entre a criança e a mãe. O
Dr. Vinelli argumenta, porém, que a creche seria só para as mães que de qualquer
forma não poderiam cuidar de seus filhos. As demais não os mandariam à creche:
Porque para ella não foi felizmente creado esse estabelecimento (...) É a
necessidade que se impõe, que obrigada a mãi a essa separação
temporária e diante da necessidade tudo se inclina. A creche foi feita
exclusivamente para aqquelas mãis que não podem conservar junto de si
os filhinhos pela necessidade que têm de ganharem pelo trabalho o pão
cotidiano.
(...) A creche é pois um meio de conciliar os santos deveres da maternidade
com as exigências do trabalho. (A Mãi de Família, jan. 1879)
Termina propondo que a Irmandade da Misericórdia, além de cuidar dos
expostos, ajude também as
(...) mães pobres e honestas a crearem seus filhinhos, promettendo-lhes
assim conseguirem o alimento de cada dia, santificado pelo suor do
trabalho (A Mãi de Família, mar. 1879)
O médico dos expostos, portanto, inspirado na solução francesa, propõe de
forma bastante inovadora para a época a introdução da creche para atender à
mesma população alvo da Roda: os filhos de escravas ou ex-escravas destinados
ao abandono em decorrência do trabalho materno. Essa solução, porém, perfeita
para essa população, o era apenas diante da inevitabilidade do trabalho materno.
Para as crianças bem-nascidas, valia a regra de ouro: serem amamentadas e
cuidadas por sua própria mãe, a quem a sociedade fechava as possibilidades de
estudo e trabalho. A imprescindibilidade da função materna era um dos
argumentos usados para justificar o afastamento feminino do mundo do trabalho.
A questão do conflito, portanto, fruto da possibilidade de opção, inexistia. As
regras estavam socialmente bem definidas: às mulheres das classes abastadas,
destinava-se a maternidade. Às pobres, o trabalho. A mentalidade dominante a
respeito da função eminentemente materna da mulher, entretanto, provavelmente
deixava na mulher que precisava trabalhar um profundo sentimento de culpa e de
impotência. Deveria dedicar à criança todos os momentos que não fossem
consumidos no trabalho (para tal, a creche abria somente nos dias úteis e durante
as horas de trabalho) e teria sua conduta sempre na mira da filantropia (afinal, a
creche é um “estabelecimento de beneficência” destinado apenas às mães de
“boa conduta”).
Se o objetivo de “fazer do dever um culto” era comum à creche, à sala de
asilo e à escola primária, no caso da creche esse objetivo poderia ser pretendido
apenas em relação à mãe, já que a faixa etária da criança (0 a 2 anos) o tornava
impossível. O mesmo não ocorria nas salas de asilo, onde a idade das crianças já
permitia uma ação disciplinadora.
É interessante notar o paralelismo do discurso francês e do brasileiro no
tocante às razões da necessidade da creche.
Na França,
(...) enquanto o povo só gozava (no Antigo Regime) de uma liberdade
relativa, a nobreza provia todas as suas necessidades. Não havia motivo de
se preocupar com o amanhã (11);
enquanto, no Brasil,
(...) escravas trabalhavam para seus senhores, que por sua vez eram
obrigados a lhe dar alimentação, domicilio e vestuário, a cuidar de sua
saúde e da de seus filhos.
(11) O censo de 1872 acusa que, do total de mulheres que trabalham, 33% dedicavam-se ao serviço doméstico.
Ao que parece, franceses e brasileiros foram expulsos do paraíso pela
serpente da liberdade. A idéia das creches e salas de asilo foi então formulada
para que “o povo, ignorante de tudo e não sabendo como se servir dessa arma
terrível que é a liberdade”, pudesse ser bem orientado. A diferença é que, se
atualmente a França já alcançou seu intuito, o Brasil ainda não deu os primeiros
passos.
Ao contrário das creches, as salas de asilo francesas não aceitavam
apenas as crianças cujas mães trabalhassem. O objetivo da normalização do
comportamento infantil sobrepujava os interesses com a liberação da mão-de-obra
materna. No artigo 11 do Décret d’Organization des Salles d’Asiles temos que:
As salas de asilo públicas são abertas gratuitamente a todas as crianças
cujas famílias não podem pagar a contribuição mensal (12).
Seu usuário preferencial, porém, será o filho do proletário:
É necessário, sobretudo, para lá atrair o filho do proletário (...) aumentar o
número dos trabalhadores vigorosos, diminuir o dos seres inúteis e
perigosos, elevar, numa palavra, o pária a categoria de cidadão (13).
Para alcançar esse objetivo, as salas de asilo seguiam um regime de
funcionamento militar.
Os diferentes exercícios do dia começam, como se segue:
Formem vossos círculos! – Monitore, mãos na tábua de leitura –
Levantem-na! – Apoiem-na no ombro esquerdo! Após a haver
levantado, eles a colocam no ombro esquerdo e ficam nesta atitude até o
comando de: Comecem a leitura! Imediatamente cada monitor vira a tábua
de leitura, mostra a letra e a faz nomear por cada criança de seu círculo
(14).
As crianças participavam dos mesmo exercícios intelectuais e físicos,
independentemente de sua faixa etária.
(11) Tant que le peuple ne jouissait (dans l’Ancien Régime) que d’une liberté relative, la noblesse subvenait à tous ses
besoins. Il n’avait point à se préoccuper du lendemain (Metz, 1870, p. 1).
(12) Les salles d’asile publiques sont ouvertes gratuitement à tous les enfants dont les familles sont reconnues hors d’état
de payer la rétribution mensuelle (Metz, 1870, p. 40).
(13) Il faut surtout y appeler l’enfant du prolétaire (...) augmenter les nombres des travailleurs vigoureux, diminuer celui dos
êtres inutiles et dangereux, élever, en un mot, le paria au rang de citoyen (Metz, 1870, p. 21).
(14) Les différents exercices de la journée commencent ainsi quíl suit: Formez voz cercles! – Moniteurs, mains à la touche!
– Decrochez-la! – Portez-la à l’épaule gauche! Et restent dans cette attitude jusqu’au commandement de: Commencez la
lecture! Aussitôt chaque moniteur retourne la touche, montre la lettre et la fait nommer par chaque enfant de son cercle
(Metz, 1870, p. 74-5, grifado no original)
No Brasil, a defesa da sala de asilo vincula-se tanto à sua ação disciplinar
quanto à necessidade do trabalho feminino. Assim Cony a define, na época do
Segundo Império:
A sala de asylo recebe o filho do pobre durante o dia de trabalho de sua
mãi. Ahi é guardado com desvelo, vigiado e instruído com
dicernimento...Um digno ministro do Evangelho, o abade Tribault, diz: “A
sala de asylo não tem somente um fim moral e religioso, senão também
emminentemente social; preservando os meninos de todos os perigos a
que os expõe o abandono, impede que se tornem elles um dia prejudiciaes
à sociedade que não os soube educar”. (Cony, s.d., p. 6-7)
A questão do ensino, diz o orador, não é somente um direito da infância;
não é somente uma questão de humanidade, pode ainda considerar-se o
principal e o mais seguro meio de defesa social.
Realmente, segundo a phrase de um illustre pedagogo americano, se ante
um grande número de menores abandonados à ociosidade e aos vícios não
desperta interesse essa pergunta: o que faremos, delles? Com certeza
excitará algum esta outra: o que farão elles de nós? (Cony, s.d., p. 15-6,
grifado no original).
Pergunta sem dúvida um tanto incômoda por sua contemporaneidade.
Os argumentos de Cony são um bom exemplo da passagem da caridade à
filantropia.
O trabalho é a condição da existência do pobre; se este é forçado a
suspender seus penosos esforços, uma horrível perspectiva se lhe
apresenta; a nudez, a miséria, o desespero o assaltam e o opprimem; é
preciso morrer ou receber socorros sempre insuficientes da caridade
pública.
Milhares de famílias estão nesse caso; e é constantemente (excepto
quando a doença vem destruir o único recurso) por causa dos filhos de
quem será obrigada a cuidar, que a pobre mãi sacrifica o valor do dia de
trabalho, que talvez bastasse para facilitar algum commodo em sua humilde
habitação.
Tomai a essa pobre mãi seus filhos, guardai-os durante o dia, de modo que
ella empregue com coragem as forças que Deus lhe concede, que ao
ganho do seu marido junte o seu, e eis a família poderosamente socorrida.
(Cony, s.d., p. 7)
Como já observou Donzelot (l980), “ninguém melhor do que a criança para
fazer penetrar no seio da família, pois que ela repete com simplicidade aos pais o
que aprende. Quem poderia calcular a influência desse ensino diário sobre
espíritos cercados das trevas da ignorância? “ (Cony, s.d., p. 9).
“(...) Que sentimentos de moral e de virtude querem que os homens
embrutecidos pela miséria ou pela ignorância inspirem a seus filhos?
Quanto à instrução recebida no seio da família, é absolutamente nula ou
perigosa”. (Cony, s.d., p. 13)
Na realidade, essa função ideológica da educação remonta à primeira
iniciativa de ensino pré-escolar conhecida. Em 1770, um vale de cadeia dos
Vosges, na França, era habitado por cerca de 80 famílias. Uma população quase
selvagem, que não falava nem o francês nem o alemão. O pastor João Frederico
Oberlin fez-se mestre-escola e começou a ensinar crianças pequenas,
conseguindo desta forma converter a comunidade à civilização.
Também no Brasil, os primórdios da educação da primeira infância
atendiam a interesses específicos. É o que podemos notar no trecho do Livro do
Centenário 1500-1900 do padre Júlio Maria, citado por Moncorvo Filho (1927, p.
27):
Com que tacto elles começaram a sua grande obra pela catechése da
infância!
(...) Que delicadeza no trato do menino! Que habilidade em attrahir os
homens e as mulheres, que atraz dos filhos, vinham cantar em côro e
assistir à missa, e, seduzidos pelas harmonias da musica e pelos
explendores da solenidade e pompas do culto, deixavam de vez as
florestas, e vinham formar povoações e aldeias! Nestas, o missionário
conseguiu transformar em carpinteiros, serralheiros, ferreiros, pedreiros,
ourives, pintores, esculptores, em fabricantes de órgãos, de flautas, harpas,
guitarras, homens ainda há pouco entregues aos costumes mais ferozes e
sanguinários, conseguiam que as mulheres vivessem occupadas em
mistéres domésticos, e fossem auxiliares de seus maridos no trabalho, que
as crianças freqüentassem as escolas, e, conforme a vocação manifestada,
fossem destinadas a uma educação literária.
Fugindo a este contexto, encontramos um autor francês que também
exerceu influência no Brasil e que constitui uma exceção às idéias dominantes.
Em 1827, M. Cochin inaugurou a primeira sala de asilo modelo em Paris. Algum
tempo depois, publicou um completo manual sobre educação pré-escolar, onde a
defende tanto para pobres quando para ricos e utiliza o método pedagógico para a
mulher, que não precisaria nem ser pobre nem trabalhar para enviar o filho à sala
de asilo, e também para a criança, pois defende um método pedagógico flexível e
não um sistema militar ou um depósito de crianças. Nele, crianças ricas e pobres e
de ambos os sexos aprenderam lado a lado (Cochin, 1857).
Enquanto os jardins-de-infância já eram numerosos na maioria dos países
da Europa e na América do Norte, no Brasil, em 1880, tem-se conhecimento de
apenas dois. Consta que nessa época a Sra. Menezes Vieira dirigia, no Rio de
Janeiro, uma pré-escola anexa ao colégio do seu marido, utilizando o método de
Froebel (A Mãi de Família, fev. 1882). Também em São Paulo, em 1877, seguindo
a orientação de educadores europeus como Pestalozzi e Froebel, foram criadas
classes de pré-escola na escola Americana, atual Instituto Mackenzie (Oliveira e
Ferreira, 1986). Em ambos os casos, a população alvo era constituída pelos filhos
das famílias abastadas. São, portanto, as primeiras iniciativas onde a culpa e o
controle não são as características marcantes do atendimento pré-escolar.
Inspirado no livro de Cochin, Domignos J. B. de Almeida realiza uma
conferência na Escola da Glória (SP) em 1880, intitulada “A Educação e os
Jardins-de-Infância”. Faz referência ao decreto de 19 de abril de 1879, art. 5, de
Leôncio de Carvalho, que estabelece que se fundem jardins de crianças em todos
os distritos do município neutro. Defende, diante da “Augusta Presença de Sua
Majestade e numeroso e ilustrado auditório (A Mãi de Família, fev. 1882), a
criação de salas de asilo tanto para pobres quanto para ricos e
independentemente do trabalho externo da mãe.
N’essas 10 horas (de 8h às 18h) podem as mãis entregar-se tranqüila e
amiudamente aos seus affazeres caseiros, isto é, cozinhar, lavar,
engommar, fazer e concertar as roupas delles. (A Mãi de Família, maio
1882, p. 67)
O conferencista termina propondo às senhoras que fundem uma
associação para criação de jardins de crianças que utilizem o método intuitivo de
Froebel.
Falla-se muito actualmente na emancipação da mulher, é pois azada a
ocasião, emancipai-vos minhas senhoras (não para votantes de eleições)
fundando jardins de crianças. (A Mãi de Família, junho 1882, p. 95)
O preenchimento do tempo feminino se limita aos afazeres domésticos e a
emancipação proposta é ainda bastante limitada. A cautela masculina afastará a
mulher das urnas até 1934. Este é, porém, um dos poucos momentos em todo o
período pré-republicano em que o discurso sobre a educação da primeira infância
não está diretamente ligado à reprovação da mãe que não cuida de seu filho de
forma exclusiva e utiliza a pré-escola, ou a uma ação controladora sobre as
classes populares.
No Brasil Colônia, a criança e a maternidade tinham pouca importância. A
mulher branca entregava, sem maiores conflitos, seus filhos às amas. A escrava
incorporava o filho ao trabalho cotidiano ou colocava-o na Roda, por opção ou
coação.
Em qualquer desses casos, a mortalidade infantil, apesar de numerosa, não
era vivida pelas mães com muito sofrimento. Tampouco a função materna possuía
destaque especial.
A partir da Independência, mas sobretudo no Segundo Império, essa
situação começa a se modificar. A filantropia, tal como descrita por Donzelot
(1980), se coloca a serviço do Estado para melhor conduzir o corpo social. Seus
representantes, os métodos higienistas, começam uma cruzada de valorização da
função materna, que desembocará na aliança estabelecida com a mulher
burguesa.
A amamentação ganha especial destaque e as amas-de-leite são
reprovadas. Muitos artigos apavoram as mães para o perigo das amas e
denunciam aquelas que, fugindo a sua função “natural”, insistem em não se
ocupar pessoalmente dos filhos. A classe dominante reconhece que esse
procedimento deveria ser também seguido pelas escravas, já que o “instinto
materno” estava presente até nos irracionais. O custo operacional dessa idéia,
porém, elimina sua execução prática. Como uma pequena compensação, os
higienistas começam a defender a criação de creches. Vista pelos defensores da
função materna como uma instituição altamente suspeita, ela era entretanto um
“mal menor”, já que nenhum senhor tinha a intenção de ter escravas que se
dedicassem exclusivamente à criação dos filhos, como os higienistas pregavam.
A creche poderia também fornecer à classe dominante um ganho
secundário. Além de liberar a mão-de-obra feminina e garantir a sobrevivência das
crianças da classe trabalhadora, ela podia ser um lugar privilegiado de controle
sobre essa classe. As creches e salas de asilo, portanto, com raras exceções,
assumirão o caráter controlador que a filantropia delegou à escola.
No período escravista, entretanto, apenas se fala da creche. Será na
República que ela surgirá de fato.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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SCHLICHTHRST, C. O Rio de Janeiro como é... Rio de Janeiro: Zélio Valverde,
1943.
· Nota da editoria dos Cadernos de Pesquisa:
Pelo menos três textos publicados nos últimos anos discutem a problemática
tratada pela autora, em mesmo período ou em outros momentos da história do
cuidado à criança pequena no Brasil: as dissertações de mestrado de Moysés
Kuhlmann Jr. – em especial o capítulo 3, “Assistência à infância: educando o
pobre para proteger o rico” - e de Livia M. F. Vieira que, no capítulo 4, discute a
proposta de creches do Departamento Nacional da Criança como forma de
combater a prática das criadeiras; e o artigo de Elizabeth de Magalhães e
Sonia Giacomini, que analisa contradições e conflitos presentes na utilização
das escravas amas-de-leite pela família branca:
KUHLMANN Jr., M. Educação pré-escolar no Brasil (1899-1922): exposições e
congressos patrocinando a “assistência cientifica”. São Paulo, 1990. Dissert.
(mestr.) PUC-SP
MAGALHÃES, E. K. C. & GIACOMINI, S. M. “A escrava ama-de-leite: anjo ou
demônio?” In: BARROSO, C. & Costa, A. O. (orgs.) Mulher, mulheres. São Paulo,
Fundação Carlos Chagas/Cortez, 1983, p. 73-88.
VIEIRA, L. M. F. Creches no Brasil: de mal necessário a lugar de compensar
carências rumo à construção de um projeto educativo. Belo Horizonte,1986.
Dissert. (mestr.) Fac. Educação/UFMG.
A roda dos expostos e a criança abandonada no Brasil colonial.
Marcilio, M.L. (1997). A roda dos expostos e a criança abandonada no Brasil colonial: 1726-1950. Em: Freitas. M. (Org.). História Social da Infância no Brasil. São Paulo: Cortez.

A roda dos expostos é um dispositivo com origem medieval e italiana. Inicialmente utilizada para manter o máximo de isolamento dos monges reclusos, é posteriormente adotada também para preservar o anonimato, mas agora daqueles que depositam nela bebês enjeitados.
    No Brasil, o acolhimento de órfãos através da roda se estabelece no século XVIII e segue a tradição ibérica, segundo a qual caberia a Santa Casa de Misericórdia o monopólio da assistência à infância abandonada contando, todavia, com o auxílio da respectiva Câmara Municipal. Desde então, podemos observar recorrentes tensões entre a entidade religiosa e o poder local, principalmente pela obrigação pública de contribuir financeiramente para a manutenção da Santa Casa.
    Uma vez recebida pela Misericórdia, a criança seria criada por uma ama-de-leite geralmente até os três anos. As amas, mulheres pobres e na maioria sem nenhuma instrução, recebiam um pagamento pelos serviços prestados o que podia prolongar o período de permanência dos pequenos, caso a Casa tivesse condições de pagá-la durante esse tempo. Além disso, essa situação dava margem para diversos tipos de fraudes, como mães que abandonavam seus bebês e logo em seguida se ofereciam como nutrizes. Por falta de recursos, a instituição procurava logo empregar os órfãos, tanto como aprendizes no caso dos meninos ( nas Companhias de Marinheiros ou no Arsenal de Guerra, nos quais conviviam com presos e degredados num brusca inserção no mundo do trabalho) e como domésticas no das meninas.
    Em 1828, a promulgação da Lei dos Municípios, que isenta a responsabilidade da Câmara para com os pequenos abandonados nas províncias onde houvesse uma Santa Casa de Misericórdia que assumisse a tarefa, vai significar uma das etapas de um processo de transformação do caráter caritativo da assistência para uma perspectiva mais filantrópica, com maior intervenção do Estado. É importante lembrar que as concepções de público e privado são assimiladas historicamente pelo imaginário social, dessa forma o que pertence ao âmbito restrito do público ou do privado permeia as discussões e ideologias de todo o século XIX. O que é atribuição exclusiva de um e não de outro é uma questão flexibilizada e difícil de responder nessa época.
    É também durante o século XIX que a medicina social ganha maior poder político e respaldo social através da crescente intervenção dos higienistas com suas inúmeras críticas à estrutura urbana e moral a sua volta. No que concerne a Casa dos Expostos, apontavam principalmente as altas taxas de mortalidade e a dinâmica da ama-de-leite, contando com o poder jurídico, que já esboçava outros meios de intervenção, mais corretiva e moralizante. Inicia-se então uma fase filantrópica assistencialista que pensa a educação "moralizante" das crianças como meio fundamental de torná-las úteis e de resguardar a própria sociedade. Na verdade, filantropia e caridade se permeiam, adquirindo características mútuas: de um lado as estratégias filantrópicas de prevenção da desordem e de outro, os preceitos religiosos da caridade.
A criança e sua educação na família no início do século: autoridade, limites e cotidiano.
Caldana, R.H.L.(1998). A criança e sua educação na família no início do século: autoridade, limites e cotidiano. Temas em Psicologia, vol. 6, 2, 87-103.


    A autora faz uma análise comparativa entre as concepções e metodologias da família tradicional e da moderna através de estudos teóricos e de entrevistas com pessoas idosas , procurando compreender as mudanças da relação adulto-criança no processo educativo. Seu foco encontra-se no início do século XX, resgatando os possíveis aspectos que se refletem na educação promovida pela família de hoje.
    Segundo Horkheimer , embora a Idade Moderna (aproximadamente entre o século XVI e o XVIII) nos traga a noção de individualidade e liberdade (pelo menos de forma teórica) desses sujeitos, no imaginário social, essas transformações são muito mais lentas. Sob uma perspectiva mais ampla, permanecem as relações de hierarquia e da autoridade paterna até o pleno estabelecimento de uma sociedade industrial.
    No Brasil, como em todo o ocidente, esse contraste entre a família tradicional e a moderna não dá conta de todas as variações e nuances da vida real, já que antes de tudo representam modelos paradigmáticos. Entretanto podemos identificar o início do século XX, com o ideário republicano, com a crescente urbanização, com as reformas médico-higienistas nas cidades e , é claro, com o relativo desenvolvimento industrial, como cenário importante das mudanças das relações familiares. A família burguesa atinge o auge de sua afetividade, a mulher se torna mãe com a retirada gradativa da serviçal e/ou nutriz, a puericultura se estabelece como prática cotidiana, a rigidez e restrições impostas pela autoridade dos adultos vão progressivamente diminuindo, assim como as relações entre pais e filhos vão se suavizando.
    É importante salientar que, embora os pais se preocupem em atender os desejos dos filhos, vislumbrando-os como "sujeitos desejantes": na maioria das vezes, as restrições eram colocadas ou pelas condições de vida, ou pela própria autoridade de um dos pais. Atualmente, a sociedade de consumo e o imaginário em que estamos submersos, nos dizem que os objetos desejados, anteriormente vistos como supérfluos, são na verdade, essenciais para o nosso bem-estar e felicidade. É aí que a autoridade aparece como uma idéia anacrônica , como veículo de restrições insuportáveis: em termos de relação entre pais e filhos, consideramos mais pertinente falar de uma recodificação de valores (Ariès, 1981 e Géllis, 1991, apud) cujo instrumento mais pertinente parece ser a própria sociedade de consumo.


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Profa Cristina e alunas/os do curso de Formação de Docentes do Núcleo de Dois Vizinhos - Paraná